quinta-feira, 30 de junho de 2011

Bom dia não custa nada


Sou potiguar e natalense e, há alguns meses, me lancei em uma aventura em terras cariocas por força de uma oportunidade de trabalho que surgiu.
No pouco tempo (para alguns; para mim, eternidades), fiz algumas constatações, talvez pela solidão, talvez pelo tino que sempre tive em perceber detalhes.
Em Natal, e creio eu que isso valha para todo o Estado, quiçá o Nordeste inteiro, as pessoas tem um costume básico, tão singelo que passa despercebido: cumprimentarem-se.
Pois é, saudar um ao outro, por desconhecido que seja.
É o ato banal de entrar em um elevador onde já há alguém e dizer um "bom dia", um "olá" ou até mesmo um sorriso, um menear de cabeça. É uma forma de você avisar àquela pessoa que você tem ciência de que tem companhia.
Na minha cidade, quando alguém novo, de fora, aparece, prontamente há esforços de todos para que haja acolhimento, para que o forasteiro não se sinta assim. Existe um mix de vontade de receber bem com curiosidade sobre a procedência daquele estranho, de onde ele vem e do que ele faz. Acho que é o tal do calor humano, que até então eu só achei que se referisse ao imprensado de uma lotação cheia. Talvez meu pensar fosse esse por nunca ter sentido falta do danado do aconchego.
Em casa, se você não entende muito bem o que alguém quer lhe dizer, há uma verdadeira mobilização em torno do que aquele pobre coitado quer: dizem-se sinônimos, se não der se tentam os antônimos, fala-se inglês, espanhol, chinês, gestos pra todos os lados até que finalmente rola aquele entendimento buscado e a felicidade em se compreenderem contagia, vira logo piada de mesa, marca de amizade.
Aqui não. E não digo isso em menosprezo pelo carioca, pelo fluminense ou pelo Rio de Janeiro. Digo em relação à falta de cordialidade que existe numa cidade grande. Ora, podem dizer alguns, o que você esperava saindo de uma cidade pequena como a do Sol para uma metrópole de 6 milhões de habitantes? Eu pediria desculpas pela minha ingenuidade, mas acho que ser cortês, ser educado, ser acolhedor é algo inerente ao ser humano. É algo tão básico como andar, respirar. Sinceramente, não me comove nem me convence esse argumento de que aqui é uma selva de pedras. Desculpa de amarelo é comer barro, como (lindamente) se diz na terra de Câmara Cascudo.
Não há esforço da parte dos outros em entendê-lo. Se você diz "arrodear", eles nunca darão a volta e ficarão vagando em círculos até que você "traduza" seu bom português. "Chapa" por aqui é qualquer coisa, menos dentadura, por mais que você esteja apontando para os dentes e com uma caixa de Corega na mão. Não espere estar em um elevador e entrar alguém que vá cumprimentá-lo: é chá de costas na certa, seja no elevador do seu prédio ou do trabalho; seja com roupas modestas ou indumentárias pomposas.

Engraçado que aqui eles usam o artigo definido antes do seu nome, como se você fosse único: “esse é O Ricardo". Doce ilusão. Deveriam substituir por "um", ficaria adequado. As pessoas aqui parecem ensimesmadas o tempo inteiro. Talvez por isso a taxa de suicídio daqui seja maior. Talvez a de violência. Quem sabe os muros de lindos prédios históricos se encontrem pichados por não ter tido,o infeliz, alguém que tentasse o entender, lhe dar um sonoro boa noite, um pequeno sorriso.
Que bom costume o dos nordestinos de ainda saberem se cumprimentar, de saberem receber bem. De sorrir e acolher. Não é pela beleza do solo norte-rio-grandense que falam que vivemos onde eles passam férias: é esse calor humano. Que nunca morra nosso jeito do mato e que sirva de exemplo o nosso comportamento para essa gente truncada.
Bom dia não custa nada

14 comentários:

  1. Sei bem o que é a indiferença da cidade grande, mas estou com você, não acho que a falta de um "bom dia" seja por mal, acho que foi um costume que se perdeu.

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  2. Texto muitíssimo bem escrito, por mim continuava lendo e lendo....
    Adorei! beijos
    Luiza

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  3. Adorei muito Marcelo!! Parabéns e continue escrevendo... vou sempre passar aqui p ler!! Beijo, da sua ex-concunhada-legal!

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  4. Marcelo, meu caro! que texto transparente, maduro! Admiro os que conseguem escrever textos tão claros a ponto de nos sentirmos conversando com alguém que nos seja próximo, onde haja uma identificação recíproca de ideias. Senti o mesmo que você quando passei uns poucos dias no Rio, e também tenho orgulho de ser nordestino. Pois bem, meu amigo, que sua Rocha continue firme! parabéns. Um abraço do pernambucano mais potiguar do Brasil!

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  5. Marcelo, ficou muito lindo esse texto! Parabéns! Quero ler outros! kkk Bjs. Laís Morais.

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  6. Gordo, adorei duas coisas: a criação do blog em si e o nome, super criativo. Adoro brincar com as palavras. Quanto à criação do blog não só acho uma boa idéia, como acho necessária. Pessoas como você precisam estar sempre aprimorando o gosto pela escrita, além do fato de que esse talento precisa ser dividido. Pra mim esse mundo, ainda que através de pseudônimo, serve principalmente como cano de escape. Espero que você nunca deixe de escrever, nem que seja pro seu principal leitor: você mesmo. Um beijo, Marcelo das letras. Te amo sempre.

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  7. GOSTEI DA EXPRESSÃO "CHÁ DE COSTAS". UM COMPORTAMENTO 'PEQUENININHO' PERFEITO PARA QUEM VIVE PEQUENO ENXERGANDO APENAS UM PALMO À FRENTE DO NARIZ, SUFICIENTE PARA NÃO ENXERGAR O PRÓXIMO EM QUALQUER SITUAÇÃO.

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  8. A mesma sensação que está tendo no RJ, já tive em Brasília/DF. Não moro no Nordeste e nem sou nordestino (infelizmente), então posso dar minha opinião isenta: pessoas educadas e acolhedoras. Quando sentir saudade de pessoas hospitaleiras e não der para ir ao Nordeste, visite MG. MG só não tem mar! Reza a lenda que em MG não tem mar porque o mineiro reza muito, então, de tanto rezar "livrai-nos do mar", acabou ficando sem...rssss

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  9. Texto maravilhoso, sinto o mesmo em São Paulo, mas dou bom dia a todos em todos os lugares, mesmo que de vez em quando a resposta seja um frio silêncio, afinal, não posso jogar fora a educação que meus pais me deram né? Sou Natalense e não desisto nunca!

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  10. Marcelo, não te conheço, mas achei teu blog por acaso vagando pelo Twitter.
    Sou de Natal/RN, mas moro em Brasília/DF há alguns meses e tenho uma sensação parecida com a sua por aqui. Já ouvi alguns "frios silêncios" em retorno a um Bom Dia e já falei "arrodear" sem o pessoal se esforçar para entender. Às vezes dá vontade de se tornar um pouco mais frio, mas parece que o sangue quente nordestino insiste em falar mais alto, ainda bem. Não vou generalizar: muitas pessoas são educadas e não se incomodam de raciocinar um pouco para entender nosso "palavreado". Continue fiel às suas raízes que as pessoas que retribuirem as gentilezas já valerão a pena e se sobreporão àquelas que só enxergam um palmo à frente. Abraço e boa sorte no Rio!

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  11. Ertz T. Bandeira de Mello10 de julho de 2011 às 19:29

    Bacana seu texto Marcelo mas não reflete o real modus vivendi nem do natalense nem do carioca. Talvez o seu acesso a quem o cumprimenta seja em Natal justamente porque o conhecem,Natal de nada guarda da antiga "praieira dos meus amores" como dizia a música, é terra conhecida de quem tem e não de quem é, claro que nem todos... No Rio, me refiro onde tenho ap no Leblon, é imcomparável a educação das pessoas, a gentileza parece regra. Em Natal em Ponta Negra onde tenho casa, tirando quem me conhece não vejo essa educação toda, e no trânsito? ah...aí que gritam as diferenças. Seu texto realmente é bacana e aguardo os que estarão por vir, mesmo sendo parcial vc transcreve apenas seu sentimento e saudoso carinho por sua terra, e nem se preocupe quem tiver sensibilidade entenderá que não há preconceito com carioca algum, talvez seu texto funcione como um alerta para que os que esqueceram a gentileza prestem mais atenção no próximo. Lembre-se que Rio é cidade grande ritmo diferente e mesmo assim encontram tempo pra teatros, cafés e choppinhos gelados, não "combina" com cidade de gente mal educada não é? O nosso calor nordestino é imcomparável, claro mas também corresponde a máxima que só os ignorantes são felizes rs. Mude a perspectiva, experimente vc está na cidade maravilhosa, acredite.

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  12. Marcelinho, quando mainha me falou do seu blog eu logo corri para acessar, e não me decepcionei. A propaganda que ela fez deste texto foi melhor do que muitas agências de publicidade. E como bem comentário acima, a clareza das palavras surpreende. Você está de parabéns! Quero voltar para ler vários outros textos como esse, e sem sombra de dúvidas, irei adorar todos eles. Muito sucesso pelo Rio de Janeiro e por todo lugar que você passar!
    Beijos

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  13. Prezado Marcelo,

    Concordo plenamente com o Bom Dia, senti na pele o mesmo problema durante os 15 anos que trabalhei com Paulistanos quatrocentões, semi deuses, fico porém a me perguntar, será que não fazemos o mesmo com nossos conterrânesos papa jerimuns que moram no interior e vem nos visitar ou morar em nossa Capital??????? será uma tendência do novo rítimo de vida???

    SDS,
    Alvaro Navarro Guedes

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